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Política de Cotas: governo e Congresso buscam consenso

Governo e Congresso se mobilizam esta semana em busca de um texto de consenso para garantir a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial na Câmara, com modificações que evitem o acirramento do debate. O senador Paulo Paim (PT-RS), autor do projeto, apresentou requerimento ontem na Comissão de Assunto Sociais do Senado propondo uma audiência pública em 3 de agosto para debater o assunto. E, numa reunião no Palácio do Planalto, hoje ou amanhã, o governo analisará pontos a serem negociados no projeto. A proposta é identificar pontos criticados e o que pode ser negociado.

Paim já admitiu modificações no texto aprovado no Senado, de forma a combinar cotas raciais com cotas sociais (socioeconômicas) no caso de vagas em universidades e em empregos públicos.

Paim: estatuto como instrumento de inclusão

A reunião será comandada pelo ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, com a participação dos ministros das áreas envolvidas: Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência), Fernando Haddad (Educação) e Matilde Ribeiro (Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial.

— Estamos abertos para discutir um sistema híbrido que estabeleça tanto um corte étnico como um socioeconômico. Acredito que possam chegar a um entendimento que permita a aprovação do estatuto e que ele se transforme num instrumento de inclusão — disse Paim.

O senador gaúcho sugeriu que a audiência seja realizada numa sessão conjunta das comissões de Assuntos Sociais, Direitos Humanos e Educação. Ele disse considerar fundamental a participação de representantes da sociedade civil: dois favoráveis ao sistema de cotas raciais — como o diretor da Educafro, Frei Davi, e o professor da Universidade de Brasília José Jorge de Carvalho — e dois contra: os professores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Peter Fry e Yvonne Maggi.

A secretária Matilde discordou das mudanças. Ela disse que o projeto do Estatuto está “arredondado” e já prevê critérios socioeconômicos para a reserva de vagas no ensino superior, assim como o outro projeto específico do governo sobre cotas nas universidades federais. Matilde ressalvou, porém, que está aberta ao diálogo. Ela só não abre mão do princípio de que ações afirmativas são necessárias para reparar prejuízos históricos decorrentes da escravidão e da desigualdade social no Brasil.

— Fiz parte de um grupo de trabalho que discutiu o estatuto por dois anos. Não vejo imperfeições nele. Do meu ponto de vista, o projeto está arredondado. Mas reformular o texto não é problema.

Matilde voltou a defender as cotas, rebatendo o argumento de que a atenção do governo deveria ser dada apenas a políticas universalistas, isto é, dirigidas a toda a população:

— As políticas universalistas não deram conta, ao longo da História, de um retorno efetivo para a diminuição das desigualdades raciais no país. Por isso, é importante ter a somatória das cotas raciais e sociais para acelerar a inclusão.

Defensores do estatuto estranham possível mudança

As declarações de Tarso semana passada, demonstrando a disposição do governo de apoiar a troca do sistema de cotas raciais por cotas sociais, gerou mal estar entre os defensores do estatuto. No dia seguinte, ele procurou amenizar as declarações, dizendo que o governo apenas estava disposto a discutir a questão.

— Achei muito estranhas as declarações do ministro. Eu mesmo já havia conversado com o ministro e ele garantiu que o governo apoiava a proposta — disse o deputado Luiz Alberto (PT-BA), que foi subrelator do Estatuto na Câmara.

O relator da matéria em plenário, deputado Reginaldo Germano (PP-BA), já estava com o parecer pronto. Ele pretendia manter sem alterações o substitutivo apresentado pelo senador Rodolpho Tourinho (PFL-BA). Mas diante da iniciativa de Paim de reabrir o debate, admitiu incluir no texto eventuais alterações.

— Para alcançarmos nosso objetivo, teremos de ceder em alguns pontos — disse.

Fonte: Jornal O Globo