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Eleições 2006: Investimento público maior é consenso, mas fórmulas divergem

Desde a queda da inflação, o Brasil convive com taxas de crescimento medíocres e insuficientes para melhorar a vida da população basicamente porque os investimentos na economia real estão em patamares muito baixos. No primeiro trimestre deste ano, os investimentos atingiram 20% de todas as riquezas produzidas no País, uma das menores taxas do mundo. Teriam de alcançar ao menos 25%, para o Brasil começar a atender suas necessidades básicas de desenvolvimento, geração de emprego e distribuição de renda.

Para que os investimentos avancem e o crescimento se acelere nos próximos anos, como propõe a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2007, o Estado precisa cumprir o seu paprl com mais empenho. “O investimento público é hoje a variável chave para retomar o crescimento”, diz o economista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Fernando Sarti, autor de trabalhos sobre investimentos estrangeiros. “Investimento público significa o pontapé inicial de qualquer ciclo virtuoso de crescimento”, afirma o economista Roberto Piscitelli, ex-presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal.

A importância como “pontapé inicial” do investimento público reside na capacidade de influenciar não só o Produto Interno Bruto (PIB) em si, mas também decisões patronais. Um empresário que vê o governo melhorando a infra-estrutura com obras que favorecem a atividade econômica (uma estrada que barateie o transporte de mercadorias, por exemplo) passa a acreditar – ou ao menos a supor – que as oportunidades de negócios vão surgir. E, diante disso, pode se sentir estimulado a tirar da gaveta seus próprios planos de investimento, o que significa mais faturamento para os fornecedores dele e contratação de funcionários.

“Alguns investimentos públicos são cruciais, principalmente na infra-estrutura, setor em que um agente privado não teria condições de investir sozinho. A ausência dessa infra-estrutura faz com que os investimentos privados sejam limitados ou cancelados”, diz o gerente-executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flavio Castelo Branco.

Falta de recursos e juro alto

A necessidade de reforçar o investimento público é consensual, mas esbarra na falta de recursos. Desde 1999, com o início da política de arrocho fiscal, as despesas públicas, inclusive investimentos, sofrem sucessivos cortes. A verba subtraída do orçamento federal vai para o pagamento dos rentistas, endinheirados que só financiam a dívida pública em troca dos juros escorchantes.

O caminho para driblar o caixa vazio e, portanto, incentivar o investimento público, varia conforme a linhagem econômica ou o grupo político de quem opina. Há quem defenda o abandono imediato da atual política econômica, como a candidata do PSol à Presidência da República, Heloísa Helena. Ou a combinação de ajustes e mudança gradual desta política, como o governo. Ou ainda o aprofundamento da política econômica, numa guinada de volta ao neoliberalismo que a produziu, como o presidenciável do PSDB, Geraldo Alckmin.

Apesar de significarem projetos de país distintos, as três propostas identificam a mesma causa para a escassez de recursos e investimentos, as elevadas taxas de juros do Banco Central (BC). Todos concordam que elas bloqueiam o investimento estatal na medida em que o governo desvia verba do orçamento para pagar rentistas. A coincidência termina, no entanto, na identificação do problema. A causa do juro alto e as propostas sugeridas para contorná-lo – e, assim, aumentar os investimentos públicos – são bastante divergentes.

Desenvolvimentismo, ruptura e neoliberalismo

Para o grupo desenvolvimentista do governo, liderado pelos ministros Guido Mantega (Fazenda) e Dilma Rousseff (Casa Civil), o juro do BC é elevado porque a dívida pública explodiu em função do próprio juro. O grupo aposta que, trabalhando para o País crescer, ainda que minimamente, o peso da dívida diminuirá e o juro também. Resultado: haveria menos arrocho fiscal – retirada de gastos públicos do orçamento para pagar rentistas – e, portanto, mais investimento público.

A ala diz, inclusive, que isso já estaria ocorrendo. “A arrecadação está aumentando por conta do crescimento, do lucro das empresas e da eficiência da Receita (Federal). Além disso, não existe essa explosão de gastos correntes que dizem. Isso está dando espaço para o aumento dos investimentos”, afirma Mantega.

Paralelamente ao gradualismo, o governo aposta que consegue investir em infra-estrutura recorrendo a mecanismos como as parcerias público-privadas (PPPs), lei de 2004 que ainda não funcionou na prática, e o projeto piloto de investimento (PPI), que deveria ser protegido de cortes orçamentárias mas acaba impondo cortes em outras áreas.

Na avaliação de Heloísa Helena, o gradualismo do atual governo esconderia uma rendição ao capital financeiro. Para ela, existem meios de fazer os juros cair mais brevemente – e, portanto, de impulsionar investimentos também mais rapidamente. Bastaria vontade política. Uma decisão do presidente da República, via decreto, ou do Conselho Monetário Nacional (CMN), formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC.

“É muito importante que tenhamos compreensão (…) de que é possível reduzir a taxa de juros para que nós tenhamos R$ 160 bilhões, no próximo ano, de dinheiro limpo e novo, para aumentar os gastos públicos (…), para investir nos setores que dinamizam a economia local, geram emprego, geram renda, para democratizar as políticas sociais, fazendo investimento na saúde, na educação, na segurança pública”, disse a senadora em discurso recente no Senado.

Já o neoliberalismo acha que o juro só cai se houver um enxugamento de despesas públicas – tese, aliás, professada pelo próprio “mercado”. A avaliação parte da premissa de que os especuladores do mercado, que financiam a dívida pública, estão certos ao exigir juros altos porque, com os gastos públicos se elevando, a chance de o governo parar de pagá-los aumentaria a cada dia.

O candidato tucano à Presidência endossa essa avaliação. Na última quinta-feira (10), Alckmin recebeu um estudo sobre infra-estrutura elaborado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) a pedido da recém-constituída União Nacional da Construção (UNC) que diz que o País precisa aplicar cerca de R$ 139 bilhões no setor, entre 2007 e 2010. Ao comentar o trabalho, que será entregue a todos os presidenciáveis, o tucano mais uma vez explicitou sua fórmula para o setor público ajudar naqueles investimentos: tesourando despesas e evitando "desperdícios”.

Cortes sociais

O problema com a tese do corte de gastos é que, fatalmente, afetará a área social – gastos assistenciais, com previdência, saúde e educação. Um recente boletim da assessoria econômica da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) diz que as emergências sociais brasileiras não suportam novas tesouradas. Segundo o boletim, “é pouco defensável que haja cortes de gastos sociais ou de investimentos” que, “indiscutivelmente, têm função social”.

Economistas desenvolvimentistas endossam a avaliação. “Não há espaço para cortes de gastos correntes, o país tem uma dívida social brutal”, diz Sarti, da Unicamp.

Fonte: André Barrocal/Agência Carta Maior