Notícia

Após quatro anos, governo Lula e servidores voltam a se digladiar

No início da primeira gestão Lula, em 2003, o governo entrou em guerra com funcionários públicos, ao decidir mexer nas aposentadorias deles. A batalha terminou com uma reforma da Previdência dos servidores e o distanciamento político do PT de uma base social histórica. Quatro anos depois, um novo confronto foi aberto entre o governo petista e o funcionalismo, como ficou claro nesta quarta-feira (23), tanto nas mobilizações do Dia Nacional de Lutas realizadas em Brasília, quanto em um debate acalorado que aconteceu no Congresso.

O novo enfrentamento foi deflagrado por duas propostas do governo que, como a reforma de 2003, atingem o bolso dos servidores. Uma controla gastos com pessoal nos próximos dez anos – coincidência ou não, está sendo relatada na Câmara pelo deputado José Pimentel (PT-CE), o relator da reforma. Outra impõe regras para as greves deles. Ambas alimentaram uma mobilização que teria reunido 10 mil servidores na Esplanada dos Ministérios, nos cálculos da Central Única dos Trabalhadores (CUT), uma das organizadoras do ato.

“O momento é delicado. O governo quer congelar o salário dos servidores e impor uma lei antigreve que é arbitrária”, disse Ismael José César, dirigente da CUT e da Confederação Nacional dos Servidores Públicos Federais (Condsef). “O governo foi de maneira aguda para cima do servidor”, afirmou a deputada federal Alice Portugal (PCdoB-BA).

Na manifestação, havia ainda categorias com razões particulares para reclamar. Era o caso de servidores do Ibama, em greve porque condenam a divisão do instituto em dois, como fez o governo. De funcionários do Incra e do Ministério da Cultura, paralisados para arrancar uma reestruturação de carreiras que lhes teria sido prometida. E de trabalhadores do Banco Central, que cruzaram os braços para obter reajuste salarial que também teria sido combinado com eles.

Críticas no Congresso

A mobilização encerrou-se com um ato em frente ao Congresso, onde, horas mais tarde, o inconformismo dos servidores com o governo seria vocalizado durante audiência pública que debateu o projeto que limita despesas com pessoal. Organizada pela Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público, foi marcada por um festival de críticas ao projeto. Quase sempre, sob o argumento de que conter o gasto encolherá o Estado e afetará a prestação de serviços à população.

“O projeto impede o aumento das políticas públicas num país com nível de acesso aos serviços públicos muito baixo”, afirmou Alice Portugal. Segundo ela, fica fácil entender como já faltam serviços, quando se compara o tamanho do funcionalismo no Brasil com o de outros países. Aqui, do total de trabalhadores, 8,6% estariam no setor público. Nos Estados Unidos, seriam 16%. Na Espanha, 17%. Na Inglaterra, 18%.

Caso o projeto seja aprovado, a tendência é diminuir o peso dos servidores no conjunto dos trabalhadores e das riquezas nacionais. O texto propõe que, de um ano a outro, a despesa com pessoal suba no máximo pela soma da inflação com 1,5%. O adicional seria comido pelo crescimento vegetativo da folha de pessoal, segundo José Fernando Consentin, consultor da Comissão Mista de Orçamento do Congresso. “Com essa regra, não existe margem para a contratação de novos serviços, caso a economia cresça como se espera”, afirmou.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) estima que o país crescerá 5% ao ano. Caso a previsão se confirme, o peso do gasto do governo com pessoal cairá de 5,6% das riquezas nacionais (2006) para 4,3% em 2012.

“O projeto revela a concepção hegemônica de que o Estado tem de ser apequenado cada vez mais e que o servidor é um acessório”, disse o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), na audiência. Pessimista, ele acha difícil que os servidores consigam barrar o projeto, pois a base governista é numerosa. Mesma opinião de um integrante da base, que, no entanto, condena o projeto. “O governo tem maioria folgada e vai aprovar o Estado mínimo”, afirmou Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP).

Em nota oficial, o segundo maior partido da base (PT) sinalizou disposição de ao menos sentar para negociar o projeto, pois “considera necessário dar atenção às críticas” de sindicalistas e movimentos sociais. E aproveitou para se posicionar de maneira tímida sobre a outra frente da guerra entre governo e servidores. “A defesa de medidas como a restrição ao direito de greve causa confusão no campo popular. O PT sempre defendeu e continuará defendendo o direito de greve”, disse a nota.

Fonte: Agência Carta Maior