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Funcionalismo federal vive abismo salarial inédito. Veja reportagem do jornal O DIA de Brasília

BRASÍLIA – Os reajustes salariais já concedidos pelo governo federal, que chegaram a superar a casa dos 100% para alguns grupos seletos de funcionários públicos, aprofundaram as distorções entre diversas categorias que foram contempladas com percentuais menores e que continuam com remunerações mais baixas. É o caso de funcionários do INSS, de hospitais e professores, com nível de escolaridade maior e funções mais complexas.

O jornal O DIA teve acesso às tabelas elaboradas pelos técnicos do governo com os novos salários iniciais e finais das categorias incluídas nas medidas provisórias 440 (que já foi convertida na Lei 11.890 em dezembro do ano passado) e 441 (ainda em tramitação no Congresso), que mostram essas distorções salariais do funcionalismo do Executivo. Os inativos de cada categoria também passaram a receber os novos valores conforme a classe em que se aposentaram.

Na Comissão de Valores Mobiliário (CVM), os auxiliares de serviços gerais, como operador de fotocopiadora, copeiro, agente de portaria e secretária, recebiam até o primeiro semestre de 2008 em torno de R$ 3.100. Mesmo com salários equivalentes ao dobro de outros órgãos públicos e até quatro vezes maior que na iniciativa privada, esses funcionários da CVM tiveram direito a reajuste em julho de 2008 e estão recebendo entre R$ 3.594 e R$ 3.866 atualmente. Em 2009 e 2010, haverá mais aumento, já incluído na lei aprovada, em torno de 4% em cada ano. Com isso, o menor salário será de R$ 3.905 e o maior, de R$ 4.240.

Um funcionário do INSS, responsável por análise e concessão de benefícios aos trabalhadores brasileiros, de nível mais acima – intermediário – ganha atualmente entre R$ 2.796 e R$ 4.372, mesmo depois do reajuste em 2008. Este ano, receberá entre R$ 3.607 e R$ 5.600. Os funcionários de nível auxiliar do INSS – com as mesmas funções dos da CVM – ganharão no máximo R$ 1.945. Em outros órgãos, a remuneração máxima não passará de R$ 1.600. O aumento de 2009, no entanto, previsto inicialmente para ser pago a partir de julho, deve ser adiado para o fim do ano, conforme O DIA adiantou com exclusividade em 28 de dezembro.

Os servidores federais que levaram os maiores reajustes em 2008 foram os funcionários das agências reguladoras, como Anatel (Agência Nacional das Telecomunicações), Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), aqueles órgãos mais conhecidos por fazer vistas grossas às queixas dos consumidores. Conforme informações obtidas por O DIA, a categoria levou mais do que pediu e os aumentos chegaram a mais de 100% de uma só vez. O salário inicial de analista, de nível superior, saltou de R$ 5.350 para R$ 10.892 em 2008. O final foi para R$ 14.740. Em 2009, está programado reajuste em lei aprovada em 2008 que elevará essas remunerações para R$ 11.608 e R$ 15.719, respectivamente. Para os funcionários de apoio administrativo, cuja exigência é o ensino médio, o salário inicial subiu, em julho de 2008, para R$ 4.693 e o final, para R$ 6.705. Com mais um reajuste em 2009 (em 2010 tem mais), esse técnico começará a carreira ganhando R$ 4.970 (o final passará para R$ 7.120).

O salário inicial alto nas agências reguladoras recebeu críticas do presidente da Aneel, Jelson Kelman, que considerou "muitíssimo acima do mercado" e a "um custo proibitivo" para o país. O mesmo nível de funcionário do estratégico Departamento de Apoio e Controle de Tráfego Aéreo, que reúne os controladores de vôo, está recebendo menos, mesmo depois de ter reajuste. O salário inicial está em R$ 4.210 e passará para R$ 4.631 em 2009. No final de carreira, o maior salário será de R$ 5.264, bem menos do que já ganham funcionários de mesmo nível nas agências reguladoras.

As novas remunerações confirmam a velha prática do serviço público: o servidor que atende diretamente o cidadão é o que recebe menos e quem carrega papel em gabinetes embolsa mais. "Isso explica o custo alto da folha de pessoal e a baixa qualidade do serviço público", conclui um técnico da equipe econômica. A CVM informou que os auxiliares de serviços gerais somam 44 e que não há novos concursos públicos para a função desde 1994. "Por ser um cargo de nível médio, é exigida a conclusão de ensino médio ou equivalente", explicou a autarquia. Os cargos vagos daqui em diante serão ocupados por "agentes executivos".

O DIA procurou o presidente do Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Reguladoras, João Maria Medeiros, nos dias 18 e 19 de dezembro na entidade, mas ele não retornou as ligações. Segundo uma funcionária, ele estava em confraternizações de final do ano. O Ministério do Planejamento também não quis comentar as distorções salariais.

Adiamento dos reajustes será definido esta semana

A Lei Orçamentária de 2009 foi publicada no Diário Oficial da União no dia 31 de dezembro. A partir da próxima quinta-feira, dia 15, a equipe econômica vai se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para definir a programação financeira e relacionar as despesas e receitas. Entre as principais decisões que serão tomadas nos primeiros dias deste ano, tão logo o trabalho seja retomado, está o adiamento dos reajustes previstos para os servidores federais em julho. A possibilidade de prorrogação foi antecipada com exclusividade por O DIA. Contingenciamento é a palavra-chave para definir o jogo de empurra que vem por aí. Na última semana do mês passado, após uma reunião com Lula, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, declarou que "o contingenciamento sai até o fim de janeiro, junto com o relatório de programação financeira para o ano de 2009".

A equipe terá 30 dias para apresentar o decreto com a programação financeira para adequar as despesas às previsões de receita. Oficialmente, o ministro Paulo Bernardo evitou antecipar qualquer decisão, mas é visível que haverá um conservadorismo nos primeiros meses deste ano. Como o orçamento prevê o reajuste dos servidores, o escalonamento seria pago nos últimos meses de 2009. Os retroativos seriam honrados até o mês de dezembro.

Fonte: O Dia, 12/1/2009