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Costa Doce do Rio Grande do Sul enfrenta a poluição de suas lagoas

Uma natureza privilegiada e cidades históricas vêm proporcionando um rápido crescimento do ecoturismo na Costa Doce do Rio Grande do Sul, região que começa no Lago Guaíba e se estende numa faixa junto ao litoral, até o extremo sul. Nela se encontra o maior complexo lagunar da América Latina. São mais de 30 lagoas e incontáveis banhados, destacando-se o Parque Nacional da Lagoa do Peixe, a Lagoa dos Patos e a Lagoa Mirim, estas duas as maiores do Brasil. Nas proximidades do município de Rio Grande fica ainda a Estação Ecológica do Taim, uma das mais importantes unidades de conservação do Estado.

A biodiversidade exuberante, rota de milhares de aves migratórias intercontinentais, fez o turismo ecológico despontar como uma alternativa promissora de trabalho e renda para a região. Mas há um obstáculo ao desenvolvimento do setor: a poluição crescente das lagoas pelos esgotos dos 35 municípios da Costa Doce, que não recebem nenhum tratamento. Tudo é despejado direto nas águas que os turistas procuram para se banhar, navegar, pescar, observar a fauna.

A situação preocupa muito o secretário de Turismo de São Lourenço do Sul, Zelmute Oliveira, presidente da Agência de Desenvolvimento da Costa Doce (ADCD), que está mobilizando os municípios da região na busca de uma estratégia regional contra o problema. O secretário observa que a região é muito rica em trilhas e locais de visitação. A prefeitura tem organizado e profissionalizado a sua oferta, segmentando produtos e roteiros para públicos específicos.

“Temos com isso conquistado uma visitação ascendente, temos crescido em aproximadamente 10% ao ano em níveis de visitação no conjunto de municípios da Costa Doce. São dados superiores até ao crescimento nacional, que nos animam porque eles são evolutivos e tem feito com que os empresários do setor privado, que é quem realmente faz o turismo, invistam cada vez mais”, diz.

Ele ressalta, porém, a necessidade de ações urgentes de saneamento para preservar o maior atrativo da Costa Doce: “A nossa região está ao lado do maior complexo lagunar da América Latina, um dos maiores reservatórios de água doce do planeta. É um local que possui uma característica de diversidade de fauna e flora que exige uma atenção especial dos poderes públicos para a preservação desse meio ambiente”, enfatiza Oliveira.

Situação crítica

“A situação do saneamento na nossa região é crítica, não adianta fazermos tratamento aqui no nosso município se os outros lagoa acima não fizerem a sua parte”, afirma o vice-prefeito de São Lourenço, José Daniel Raupp Martins. Ele conta que em 2006 uma invasão de algas na Lagoa dos Patos, que banha a cidade, “quase levou à lona o município”, na época de veraneio. As algas, que proliferam na água poluída, surgiram na região do Lago Guaíba e desceram pelas lagoas interligadas, espalhando mau-cheiro e espantando turistas nas orlas de Barra do Ribeiro, Tapes, Arambaré, São Lourenço, Pelotas até Rio Grande.

Já em Mostardas, o Ministério Público move uma ação civil pública desde 2004 contra a Prefeitura porque os esgotos são despejados em canais que correm a céu aberto e deságuam na Lagoa do Fumo, nos arredores da área urbana , e daí na Lagoa dos Patos “Além do grave dano ambiental que a situação acarreta, há também grande favorecimento para o surgimento de doenças ligadas à ausência de canalização e tratamento de esgotos”, afirmou o Promotor de Justiça Pietro Chicichimo Junior.

Com verba da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), a prefeitura finalmente vai construir a primeira de uma série de três ou quatro estações de tratamento de esgotos na cidade. Outra estação também já está planejada para São Lourenço do Sul. O coordenador regional da Funasa no Estado, Gustavo de Mello, diz que com recursos do PAC o Governo Federal vai investir, até 2010, R$ 4 bilhões em saneamento básico em mais de mil municípios com menos de 50 mil habitantes.

Ele alerta que existe um novo marco legal do saneamento no país, a partir da Lei 11.445 de 2007, que tem a universalização dos serviços de saneamento como princípio, o que inclui abastecimento de água, coleta e tratamento de esgotos, coleta e destino adequado de resíduos sólidos e drenagem. A mesma lei e uma resolução do Ministério das Cidades exigem que, até o fim de 2010, as Prefeituras de todo o país apresentem o seum Plano Municipal de Saneamento (PMS), definindo metas, prazos e ações para a universalização. Quem não tiver o plano, deverá encontrar dificuldades para obtenção de verbas públicas daí em diante.

Consórcio Municipal

Na verdade, a situação da Costa Doce não difere de um contexto que é estadual. Embora o Rio Grande do Sul tenha o quarto maior PIB e o quinto índice de desenvolvimento humano (IDH) mais elevado do país, a falta de investimentos nas últimas décadas, principalmente em coleta e tratamento de esgotos, levou o Estado a ocupar hoje o 15º lugar entre os estados brasileiros em saneamento, segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas encomendada pela ONG Trata Brasil.

Com suas lideranças convencidas de que o problema só pode ser enfrentado de forma conjunta, no segundo semestre do ano passado a Agência de Desenvolvimento da Costa Doce, presidida por Zelmute Oliveira, começou a se movimentar para a formação de um consórcio municipal, no qual as prefeituras se unem para formação de uma autarquia, definem um plano de ação regional, dividem os custos de administração e execução das obras, compartilham equipamentos, mão-de-obra, instalações e laboratórios.

Três encontros já foram realizados para discutir o saneamento. O último foi um seminário em São Lourenço, em dezembro, com a presença de prefeitos, vereadores, autoridades, comunidade e representantes da Funasa e Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan). A cobrança em cima da companhia tem sido muito forte, prefeitos reclamam que ela arrecada muito no fornecimento de água mas não reinveste em esgotos. A Corsan acena com a renovação dos contratos de prestação do serviço, que estão vencendo, onde poderiam ser fixados compromissos neste sentido, mas já há quem discuta a municipalização do saneamento.

“Nas próximas duas décadas o grande desafio é universalizar o serviço de esgoto, um serviço cinco vezes mais caro que a água e que na cobrança sai 40% do valor da água”, disse José Homero Finamor Pinto, representante da Corsan. Para o prefeito de São Lourenço, José Sidney Nunes de Almeida, o desenvolvimento que tanto querem os municípios da Costa Doce passa pelo cuidado com o meio ambiente e suas belíssimas lagoas: “Saneamento agora é um limite para o desenvolvimento, essa é uma questão estratégica e precisamos buscar soluções regionalizadas para isso”.

Fonte: Ulisses A. Nenê – EcoAgência