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Manifesto condena flexibilização trabalhista a reboque da crise

Centenas de profissionais ligados ao Direito – entre eles estudantes, professores, advogados, auditores fiscais, procuradores e juízes – assinam um manifesto que condena as tentativas de flexibilização da legislação trabalhista. O documento público intitulado "Contra oportunismos e em defesa do direito social" vai de encontro às propostas de mudança de normas defendidas pelo empresariado como saída para driblar os efeitos da atual crise financeira global.

Nos últimos meses, o Brasil vem assistindo a demissões em massa por parte de grandes empresas dos mais diversos setores produtivos. Os exemplos vão se multiplicando a cada dia que passa. De acordo com a Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), só em novembro do ano passado, perderam o emprego cerca de 1,5 mil trabalhadores do segmento de mineração, um dos pilares de sustentação econômica do estado.

Na indústria automobilística, a situação também é grave: só a General Motors (GM) mandou embora 744 funcionários temporários de sua fábrica de São José dos Campos (SP), no último dia 12 de janeiro. Recentemente, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, chegou a afirmar que, mesmo com a diminuição da jornada de trabalho e a redução do salário, como forma de aliviar o caixa das empresas, não haveria garantia de manutenção dos empregos.

A Repórter Brasil conversou com Jorge Souto Maior, juiz da 3ª Vara o Trabalho de Jundiaí e professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), um dos idealizadores do manifesto.

Repórter Brasil – Desde o agravamento da crise financeira global, no apagar das luzes do ano passado, diversas empresas têm anunciado planos para reduzir gastos com a folha de pagamento. Entidades representativas, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Fiesp, já vieram a público solicitar a flexibilização da legislação trabalhista como forma de combater a crise. No entanto, vale lembrar que alguns setores, como a indústria automobilística, bateram recorde de vendas e de faturamento em 2008. Como o senhor avalia as propostas do segmento empresarial?

Jorge Souto Maior – Esta é uma postura totalmente injustificada que, ademais, gera uma corrida insana e sem rumo em diversos outros segmentos produtivos. Mesmo sem sentir efeito algum da crise, em razão do clima criado, passa-se a vivenciá-la e a retrair atividades.

Esta tática de gerar pânico para obtenção de vantagem, atenta, pois, contra a ordem econômica, nos termos da Lei 8.884/94, podendo até mesmo ser considerada um crime de lesa-pátria. Afinal, todas as avaliações sobre a causa da presente crise são unânimes em dizer que sua origem está ligada à desregulação do mercado financeiro, ou, em palavras mais claras, à não imposição de limites às possibilidades de ganho a partir da especulação. É fato, portanto, que o custo da produção não está na origem do problema e nada autoriza a dizer que a sua redução possa ser fator determinante para que a crise seja suplantada.

As propostas de superação da crise a partir do postulado da redução do custo do trabalho, conseqüentemente, não partem da raiz do problema, podendo ser consideradas, de certo modo, oportunistas, na medida em que são formulados antes mesmo da crise ter dado mostras claras de ter atingido a economia real (produção e consumo), a não ser, é claro, em certos segmentos que já estavam estagnados (a crise da General Motors não é de agora), saturados ou em risco e em outros que promoveram, por conta própria, sem uma razão específica, um saneamento de custos, com redução de pessoal.

As ameaças de dispensas coletivas – que, ademais, atentam contra a ordem jurídica, por ferirem o disposto no inciso I, do artigo 7º, da Constituição Federal (CF) – proferidas por algumas grandes empresas apresentam-se, no geral, como meras estratégias de pressão, de natureza política, para extraírem vantagens econômicas a partir do temor e da insegurança que geram sobre os trabalhadores, ainda mais considerados os reiterados noticiários sobre a crise.

Recentemente, o titular do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Carlos Lupi, declarou que o Governo Federal só liberaria recursos públicos para empresas que se comprometessem a não demitir seus funcionários. De que forma o poder público deve atuar para garantir o respeito e o cumprimento à legislação trabalhista vigente?

Cabe que as instituições criadas para tanto (Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Justiça do Trabalho) cumpram o seu papel, deixando claro para a sociedade que a ordem jurídica deve ser por todos respeitada.

Nas últimas semanas, centrais sindicais e entidades empresariais se reuniram para debater alternativas às ameaças de demissões. Ao mesmo tempo, vem aumentando o número de manifestação.

Fonte: Carlos Juliano Barros/Repórter Brasil