Reajuste do servidor: o dilema do Governo Lula, artigo de Antônio Augusto de Queiroz
O Governo do presidente Lula, diante da crise econômica, está analisando financeira, jurídica e politicamente que decisão tomar acerca do reajuste dos servidores civis e militares previstos em lei para o segundo semestre deste ano. São três cenários: 1) suspender, 2) adiar ou 3) pagar, de acordo com o calendário previsto em lei. Uma eventual decisão pela suspensão ou pelo adiamento terá efeito devastador na relação do governo-servidor, superior ao desgaste provocado pela reforma de Previdência.
Financeiramente só teria sentido suspender ou adiar o reajuste, previsto em lei para civis e militares, se o superávit primário fosse zerado ou houvesse déficit entre receita e despesa, o que não se afigura, apesar da crise. Se houver superávit (e haverá), cuja finalidade é pagar juros das dívidas interna e externa, e, mesmo assim, o Governo decidir adiar ou suspender o reajuste estará fazendo uma opção política pela banca, que jamais será perdoada pelo funcionalismo.
Juridicamente, as dúvidas são sobre o instrumento a ser empregado, caso decida pelo adiamento ou suspensão, e sobre quem atingir com a decisão. No primeiro caso, alguns advogam que um simples decreto, desde que comprovada a queda da receita, seria suficiente. Outros entendem que somente por lei poderá alterar o calendário previsto nas leis de reajuste e neste caso seria editada uma MP. No segundo, a dúvida é se adia ou suspende, no caso dos civis, apenas das carreiras de Estado ou, ao contrário, se paga apenas a estas em detrimento dos funcionários administrativos. Uma alternativa seria pagar aos militares e rifar os civis ou o inverso.
Ainda no plano jurídico, há dúvidas sobre se o adiamento ou suspensão seria do valor integral previsto para 2009 ou se proporia um parcelamento, pagando parte do percentual e adiando ou suspendendo a quitação do restante. Neste caso necessariamente a decisão teria que ser por lei.
Politicamente, a equação é complexa e terá reflexos sobre a eleição presidencial em 2010. Nenhum servidor, civil ou militar, que aguarda reajuste assegurado em lei irá aceitar, pacificamente, o adiamento ou, pior ainda, a suspensão desse direito. A "lua de mel" existente entre Governo e servidor será substituída pela separação irreconciliável. Greves pipocarão em todas as carreiras (dos administrativos às carreiras de Estado) na área civil, e manifestações indignadas serão conduzidas pelos militares, especialmente os oficiais, cujo reajuste está previsto para o segundo semestre.
Os aposentados do serviço público, que até hoje não perdoaram o Governo pela instituição da cobrança de contribuição previdenciária, mas mantinham uma boa relação exatamente por força desses reajustes, imediatamente irão para as ruas denunciar o Governo e recomendar votos nos adversários, na sucessão presidencial do próximo ano.
O Governo, portanto, deve pensar muito bem antes de tomar uma decisão em relação a este tema. Os ganhos do funcionalismo federal são referência para o estadual e municipal e se houver recuo na esfera federal, os efeitos atingirão também os outros níveis de governo. Logo, uma decisão pela suspensão ou adiamento do reajuste terá a oposição do conjunto dos servidores, nas três esferas de governo. O estrago na campanha do candidato oficial será imensurável, caso decida por não cumprir o cronograma de reajuste previsto em lei.
Antônio Augusto de Queiroz, jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap