DIEESE avalia impactos dos possíveis novos vínculos de contratação no serviço público

A proposta de reforma administrativa contida na PEC 32/2020 prevê, entre outras alterações, a extinção do chamado Regime Jurídico Único no serviço público, com a instituição de uma série de novas formas de contratação pela administração pública. Com o objetivo de explicitar quais serão essas novas formas de contratação e os possíveis impactos decorrentes dessas mudanças, caso a PEC seja aprovada nos atuais termos, o DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos publicou uma Nota Técnica.

No documento, o DIEESE enfatiza que a PEC 32/2020 propõe “a criação de vínculos sem estabilidade, com acesso feito sem a realização de concurso público e com possibilidade de aumento do peso das indicações políticas”. A Reforma Administrativa “traz para a administração pública problemas que hoje são típicos do setor privado, notadamente a rotatividade. E ainda pior: maximiza a possibilidade de que os interesses privados e de corporações se coloquem acima do interesse coletivo, ao ampliar a figura do contrato por prazo determinado e o leque de destinação dos cargos de liderança e assessoramento, em relação ao que hoje cabe aos cargos em comissão e funções de confiança.

LEIA A NOTA TÉCNICA NA ÍNTEGRADIEESE – Os novos vínculos de contratação no serviço público propostos na PEC 32/2020
Cargos técnicos ameaçados! – (Cargo de liderança e assessoramento)

Da Nota Técnica publicada pelo DIEESE, destacamos os impactos da modalidade de contratação criada pela Reforma Administrativa, chamada de Cargo de Liderança e Assessoramento.

“Os cargos de liderança e assessoramento irão substituir os atuais cargos em comissão e as funções de confiança, que atualmente são destinados, por comando constitucional, apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento. Como se sabe, as funções de confiança podem ser ocupadas apenas por servidores que ocupam cargos efetivos na administração pública e os cargos em comissão são preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei. Para os futuros cargos de liderança e assessoramento não há restrição no texto da PEC para que somente servidores efetivos possam ocupá-los e nem mesmo qualquer percentual lhes seja destinado. Assim, pelo fato de que esses cargos serão preenchidos por meio de ato do chefe de cada Poder em cada ente, a princípio qualquer pessoa, desde que preencha requisitos legais, poderia acessar esses cargos.

Talvez ainda mais importante e perigoso seja o fato de que os cargos de liderança e assessoramento que serão criados, caso a PEC 32/2020 seja aprovada, poderão ser destinados às atribuições técnicas no âmbito da Administração Pública. Como é do conhecimento geral, há no setor público centenas, talvez milhares de funções, de caráter técnico, cujos ocupantes desempenham trabalhos de grande relevância para o Estado brasileiro e para toda a sociedade. São servidores que prestaram concurso público, possuem grande qualificação e passam por processos de treinamento e ganhos de qualificação ao longo de suas carreiras públicas Caso a PEC seja aprovada, essas funções poderão ser ocupadas por indivíduos indicados politicamente, que não tenham qualquer compromisso coletivo, mas sim com as corporações ou grupos de interesse responsáveis por sua indicação.”

Estabilidade frágil – (Cargos típico de Estado)

O DIEESE destaca a estabilidade frágil dos servidores que ocuparão os cargos típicos de Estado. “Em primeiro lugar, a PEC 32/2020 abre a possibilidade para que a perda do cargo ocorra após decisão proferida por órgão judicial colegiado. Esse dispositivo pode causar grandes injustiças, pois pode impedir que instâncias superiores revejam decisões equivocadas. Em segundo lugar, a proposta insere no texto constitucional a solicitação de lei ordinária (que não exige quórum qualificado) para a definição dos critérios que serão levados em conta nos procedimentos de avaliação dos servidores. Isso significa a possiblidade de que seja mais facilmente aprovada ou modificada uma legislação que defina critérios subjetivos de avaliação dos servidores, fazendo com que a perda do cargo seja enormemente facilitada.”

Contratados por concurso, porém sem estabilidade – (Cargo com vínculo por prazo indeterminado)

A Reforma Administrativa possibilitará contratações por tempo indeterminado via concurso público. “Os servidores contratados com vínculo por prazo indeterminado não terão qualquer possibilidade de conquistar a estabilidade. O acesso a esses cargos se dará por concurso público e o futuro servidor terá de passar por, no mínimo, um ano em vínculo de experiência e precisará ter desempenho satisfatório para permanecer no cargo. Os futuros servidores poderão perder o cargo acordo com critérios definidos em lei ordinária e serão, a princípio, vinculados ao Regime Próprio de Previdência, havendo a possibilidade de que lei do ente em questão os transfira para o Regime Geral de Previdência Social. Também se abre precedente para favorecimentos e perseguições de caráter político, retirando do servidor as condições para que exerça sua função independente do governo de ocasião. Isso poderá levar à queda da qualidade do serviço público prestado à população.

Contratação simplificada – (Cargo com vínculo por prazo determinado)

Talvez uma das modalidades mais preocupantes de contração propostas pela Reforma Administrativa é a contratação por tempo determinado.

Neste caso, o processo de contratação se dará por seleção simplificada, termo que a PEC32/2020 não define. Essa modalidade de contratação se dará em observância a pelo menos uma das seguintes possibilidades:

I – necessidade temporária decorrente de calamidade, de emergência, de paralisação de atividades essenciais ou de acúmulo transitório de serviço;

II – atividades, projetos ou necessidades de caráter temporário ou sazonal, com indicação expressa da duração dos contratos; e

III – atividades ou procedimentos sob demanda.

“A alteração proposta pela PEC 32/2020 insere no texto constitucional situações muito amplas para a utilização desse tipo de contratação na administração pública. A primeira possibilidade traz a situação de paralisação de atividades essenciais. Assim, em uma possível greve, esse tipo de contratação pode ser utilizada para substituir os servidores públicos grevistas, colocando em xeque a eficácia do movimento reivindicatório. Já no que diz respeito à terceira possibilidade, abre-se um leque muito amplo para a administração pública realizar esse tipo de contratação, pois não fica definido o significado jurídico do termo “sob demanda”, trazendo a possibilidade da utilização de critérios de conveniência momentânea para as contratações de trabalhadores e não de interesse de longo prazo da sociedade. Os servidores contratados por contrato determinado serão vinculados ao Regime Geral de Previdência e seu vínculo se encerra no término do contrato”