Carta aberta dos servidores da UFRGS: “A covid-19 e a responsabilidade dos poderes públicos”

No dia 20/02/2021, docentes e técnicos da Faculdade de Direito da UFRGS postaram a carta-manifesto solicitando o fim do governo genocida de Bolsonaro. Agora, o grupo abre a possibilidade para que todos os servidores da UFRGS, possam assinar esta carta-manifesto. A adesão está aberta indistintamente a servidores (docentes e técnicos) desde que sejam da UFRGS, na ativa ou aposentados(as). Responda às informações solicitadas no formulário após o texto para assinar o manifesto.

CARTA ABERTA DOS PROFESSORES E SERVIDORES DA UFRGS (22/02/2021)

A COVID 19 E A RESPONSABILIDADE DOS PODERES PÚBLICOS

A COVID-19 já vitimou de modo fatal mais de 230 mil pessoas no Brasil. Mais de 9,5 milhões de brasileiras e brasileiros já foram contaminados pelo novo coronavírus. Desde que esse pesadelo teve início, temos acompanhado a inaceitável atuação do Sr. Jair Messias Bolsonaro, com pronunciamentos e medidas concretas que ultrapassam, em muito, a esfera do despreparo para ocupar o cargo de Presidente da República ou do descuido para com a vida da população brasileira.

É verdade que a pandemia já encontrou um Brasil esfacelado por medidas adotadas em governos anteriores, como o congelamento de investimentos sociais, por força da Emenda Constitucional n.º 95/2016, que levaram a uma redução drástica dos recursos públicos destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS). Mesmo assim, impressionam as ações praticadas pelo Sr. Presidente fragilizando ainda mais o SUS em plena pandemia, a exemplo das sucessivas trocas no comando do Ministério da Saúde, que culminaram na nomeação de um General do Exército e de outros oficiais das Forças Armadas, servidores militares atuando fora das suas funções de carreira, completamente inaptos para o exercício de atribuições no serviço público em uma área tão complexa como a da saúde.

A assombrosa campanha de minimização da gravidade da pandemia deflagrada com a conivência presidencial não apenas fragiliza ainda mais o dedicado trabalho dos profissionais que atuam no SUS, como também confunde a população, contribuindo decisivamente para a disseminação da doença. A atuação pessoal do Presidente da República, no auge de uma crise sanitária, seja pelo incentivo à realização de aglomerações e ao abandono da utilização das máscaras, seja pela recomendação de medicamentos sem comprovada eficácia na prevenção ou tratamento da COVID-19, na contramão das orientações da comunidade científica e da Organização Mundial da Saúde (OMS), ultrapassa limites éticos, jurídicos e humanitários.

Trata-se, pois, de uma atuação política deliberada, descrita recentemente como “estratégia institucional de propagação do vírus” em estudo do Centro de Pesquisas e Estudos de Direito Sanitário (CEPEDISA) da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com a organização não governamental Conectas Direitos Humanos. O Sr. Presidente exerce o mais alto cargo da República como se a saúde não fosse um direito fundamental, previsto nos artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988, correspondente a deveres do Poder Público previstos nos artigos 23, II, 196, 198 (em especial o inciso II) e 200 (em especial os incisos I, II e V) do texto constitucional. A infeliz constatação a que se chega é que a omissão do Governo Federal transformou cidades brasileiras como Manaus em laboratórios da mais dramática experiência genocida realizada nos últimos anos, que se nega a vida, por asfixia, em frontal agressão aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da solidariedade e do combate à discriminação.

Diante desse cenário, as condutas perpetradas pelo Chefe do Executivo devem ser, com urgência, devidamente apuradas e julgadas, conforme dita o direito pátrio, para fins de verificação da prática, em tese, dos crimes de responsabilidade descritos no artigo 85 da Constituição Federal e na Lei n.° 1.079/1950.

Engana-se, porém, quem pensa ser essa uma imputação exclusiva ao Presidente da República. Deve-se combater uma política que vem sendo adotada de modo sistêmico, por meio da omissão de agentes e instituições do país que têm o dever cívico de se posicionar e de atuar diante do cenário catastrófico em que fomos catapultados.

O dever cívico nos convoca a fazer o registro histórico de que sabemos que o nível de adoecimento e mortalidade no Brasil, por complicações decorrentes da COVID-19 e causas colaterais, bem como o aprofundamento do desemprego, do desamparo e da miséria, constituem circunstâncias que decorrem de escolhas políticas que traduzem um deliberado descumprimento de deveres constitucionais.

Não há mais tempo nem espaço para a omissão.

Silenciar é agir para que isso continue ocorrendo. Por isso, as professoras e os professores de Direito da UFRGS, bem como servidoras e servidores, abaixo assinados manifestam seu repúdio, entendendo ser oportuna e necessária a abertura de procedimento de impeachment do Presidente da República pelo Congresso Nacional.

Entendemos indispensável que, ao lado disso, ocorram ressignificações de projetos políticos para que promovam condições decentes de vida para todas as pessoas, por meio de uma democracia que reflita vivamente os valores contidos na Constituição Federal.

Não é um caminho simples, nem curto, mas precisa ter um início. O começo coincide com o fim da aposta na barbárie.

Confira os colegas servidores da UFRGS que já assinaram o documento e assine também preenchendo o formulário disponível no link abaixo:

https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLScFIOJPPF0j-wA3JoASiMn8tQgsXJt_eGz7x0zN21iRCWTnfg/viewform