Construção de torres no Beira-Rio impacta comunidades quilombolas, meio ambiente e escolas de samba
A obra consiste no que seria o maior prédio do Rio Grande do Sul e traz impactos negativos para comunidades quilombolas que residem no local antes mesmo da construção do Estádio Beira-Rio. Prejudicará o meio ambiente, escolas de samba da região e toda moradia que habita o bairro ao redor.
O Sport Club Internacional quer construir duas torres – uma com 130 metros de altura e outra com 80 metros – num terreno de 2,5 hectares onde hoje fica um estacionamento ao ar livre, próximo ao portão 7 do Estádio Beira-Rio. Os prédios teriam uso comercial e também residencial.
Comunidades Quilombolas, escolas de samba e a própria torcida esportiva do clube se posicionam contra este projeto.
Sandro Gonçalves de Lemos, Líder da comunidade do Quilombo Lemos, afirma que estão atentos a todas as movimentações desse projeto, pois ele vem sendo silenciado de maneira proposital, nem a torcida do Inter sabe sobre os detalhes do projeto. O Clube não dialoga com o seu torcedor e a prefeitura não dialoga com a população, justamente porque “não é interessante a Porto Alegre, não é interessante ao bairro e suas propostas não correspondem aos moradores, do quilombo, Vila Ecológica e Vila Gaúcha. Fala-se em alargar a José de Alencar, e em um projeto multiuso das escolas de samba, que seria um desmonte da cultura que ainda tem em PoA, fazendo com que as diferentes escolas estejam no mesmo ambiente.”
“Observando o cenário urbano da cidade de Porto Alegre, desde a Av. Ipiranga até o Iberê, da Av. Borges de Medeiros à Av, Pe. Cacique em direção ao Guaíba, tudo é destinado ao público, uma obra deste porte e de inciativa privada não se enquadra à região e muito menos conversa com a identidade do Clube do Povo”, finaliza Sandro Lemos.
Ivandro Morbach, conselheiro do Povo do Clube, afirma que estão trabalhando “tanto internamente no clube, quanto externamente junto a outras organizações para barrar a proposta. Queremos inclusive que pare a sua tramitação na Câmara de Vereadores enquanto a matéria não for debatida internamente nas instâncias do Inter.” Ainda ressalta que “Nenhum dirigente tem autorização para negociar a aprovação do projeto em nome do clube sem a aprovação do conselho, uma vez que empreendimento imobiliário não está entre as finalidades do Internacional.” O Povo do Clube possui 78 conselheiros que votarão contra o projeto.
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O Internacional, na década de 50, recebeu o terreno do município para erguer o seu estágio e as áreas adjacentes seriam de apoio e renda ao clube. Entregar parte do seu patrimônio para uma iniciativa privada é ser contrário ao acordo. Originalmente, se autorizou somente a construção do estádio, e uma alteração de 1988 permitiu erguer comércio que servisse de apoio financeiro para o clube na sua finalidade, que é a prática esportiva. O uso como habitação não era citado.
Um arranha-céu localizado à beira do Guaíba causaria um bloqueio do sol e da circulação de ar, o que causaria um enorme impacto ambiental na região e ainda prejudicaria a qualidade de vida dos moradores que já habitam ali. Porto Alegre é a capital mais arborizada do país e se dedicava para a despoluição do guaíba, mas isso tudo vem sendo deixado de lado por conta de um discurso economista e modernista que busca aproximar a imagem da capital à cidades como Balneário Camboriú, repleto de arranha-céus. Essa lógica empresarial busca preservar o benefício econômico em detrimento do debate ambiental.
O processo de elitização do local público
Embora dirigentes do clube apontem que será “comercialmente mais atrativo e financeiramente valorizado, ainda mais tendo o Guaíba como plano de fundo, gerando maior integração com a área, que hoje só há em dias de jogo”, se sabe que tal projeto não será destinado ao público, e não acolherá as comunidades ao redor. A obra beneficiará exclusivamente as grandes empreiteiras e imobiliárias que lucram milhões com a privatização de espaços públicos. É necessário se atentar a esse desejo de “valorizar comercialmente a região”, afinal, Porto Alegre possui um histórico de projetos urbanos que visavam a melhoria da cidade quando na verdade buscavam apenas afastar a população negra e pobre das regiões do centro, as realojando nos extremos norte e sul da capital.
O líder quilombola ainda questiona “Quem vai poder acessar esse mega empreendimento? Dizem que o povo vai poder. Vai sim, mas como faxineiro, guardador de carro, segurança, com o subemprego que vão oferecer para a grande parcela da sociedade, que somos nós, quem trabalha e quem produz”
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A Frente Quilombola, o Quilombo Lemos, entidades carnavalescas, o Povo do Clube e a Coluna Vermelha, têm se organizado coletivamente em reuniões na Quadra da Imperadores para debater contra esse projeto, que ainda precisa ser aprovado na Câmara de Vereadores. “São homens brancos, ricos e engravatados, que não nos conhecem, e decidem a vida de grande parte da população de PoA, sobretudo do quilombo, do próprio Internacional e das Escolas de Samba, e por isso, em nossa última reunião que tivemos, no dia 28, decidimos que nós não queremos contrapartida, a gente quer regularização fundiária para esses espaços de escolas de samba, quilombos, Vila Ecológica, Vila Gaúcha” afirmou o líder do Quilombo Lemos sobre como querem se articular diante desse projeto.
A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Esse direito garante a essas comunidades a permanência nos lugares na qual já ocupam.