Como Arcabouço Fiscal pode afetar o acordo dos TAES
por Ricardo Souza Araujo – Coordenador Jurídico e de Relações de Trabalho da ASSUFRGS Sindicato
Esta semana é aprovada a urgência do pacote de ajuste fiscal encaminhado pelo ministro Fernando Haddad, aliado ao Congresso Nacional, em pleno final de ano. Resumidamente, corremos o risco de retroceder em conquistas históricas, como fim dos pisos constitucionais da saúde e da educação, fim da política de valorização do salário mínimo e benefícios sociais como o BPC e Abono-Salarial, bem como sequer garantir o reajuste conquistado em acordos de greve da Educação, conduzida pela Fasubra, Sinasefe e Andes.
O conjunto de medidas é a continuidade do Arcabouço Fiscal, ou novo teto de gasto, dando legitimidade à agenda do golpe de 2016. É urgente a mobilização de todas e todos para fechar o ano legislativo sem este projeto aprovado, ou ao menos, desidratado em seus ataques mais brutais.
O ministro Haddad fez um pronunciamento que teve como eixo “maquiar” o pacto anti-povo citando outras medidas, vistas como populares, como parte de um mesmo conjunto, por exemplo a isenção do Imposto de Renda para aqueles que ganham até 5 mil reais (promessa de campanha), com taxação maior para aqueles que ganham mais de 50 mil além da reforma sobre as pensões militares. Embora positivas, nada disto consta no pacote de medidas em tramitação, e o próprio Haddad, bem como os presidentes da Câmara e do Senado já afirmam que será votado só ano que vem as alterações no imposto de renda, sem garantia de aprovação, ou seja, na “volta a gente compra”.
Este pacote de medidas tem como objetivo assegurar o Arcabouço Fiscal, ou melhor, Novo Teto de Gastos, aprovado em 2023. Como já afirmava David Decache, em seminário da Assufrgs em fevereiro deste ano, o arcabouço é incompatível com conquistas históricas da classe trabalhadora, como o piso constitucional da saúde e da educação (que sequer Bolsonaro e Guedes conseguiram atacar) e a política de valorização do salário mínimo. Justamente estes e outros direitos estão em risco com esses pacote de medidas:
1) PEC 45/2024[1]:
Altera a constituição acomodando os mecanismos do arcabouço fiscal
à) prorroga novamente a Desvinculação da Receita da União(DRU) de 30% do recurso da seguridade social ser destinado ao Sistema da Dívida Pública;
b) determina que 20% do orçamento do Fundeb seja destinado a educação de tempo integral (sem incremento do orçamento);
c) reduz gradualmente a faixa de renda de acesso ao abono salarial de 2 para 1,5 salários mínimos;
d) abre a possibilidade da desconstitucionalização dos pisos da saúde e da educação, tendo seu crescimento restrito ao limite do arcabouço fiscal, como destaca Decache[2]:
2)PLP 210/2024[3]
Altera a lei complementar 200/23 do arcabouço fiscal, permitindo que caso não haja superávit fiscal o reajuste da folha de pagamento de servidores não possa crescer mais 0,6% acima da inflação de um ano para outro (sem considerar anos de congelamento salarial), colocando em risco inclusive um “calote” em acordos de greve de servidores da educação (Fasubra, Sinasefe e Andes) que conquistaram um reajuste de 9% para 2025, 5% para 2026, além de reestruturação de carreiras. Será queestes valores cabem na inflação e nos 06,% de crescimento global da folha de pagamento?
3) PL 4614
Busca prejudicar a população mais pobre, pois limita o reajuste do salário mínimo até 2,5% acima da inflação, desconsiderando o crescimento do PIB, como foi praticado nos governos petistas anteriores. Além disso, dificulta o acesso da população mais pobre ao bolsa família, abono salarial e BPC[4].
Mas será que criticar a proposta do governo não fortalece a extrema direita? Historicamente, os fenômenos fascistas e golpistas crescem e prosperam na incapacidade da social-democracia em enfrentar a crise capitalista e oferecer alternativas para o povo. Assim, venceu Milei na Argetina frente à inflação galopante no Governo de Alberto Fernandes, ou o próprio Trump, em que parcelas do povo norte americano não percebeu melhoria nas condições de vida no governo Biden.
A austeridade pavimenta o caminho do fascismo, seja ela aplicada diretamente pela extrema-direita, seja ela aplicada por um liberalismo progressista, que promete melhorias à classe trabalhadora e ao chegar ao governo dão continuidade aos planos de austeridade e abrem caminho para o fortalecimento da extrema direita, como já ocorreu em muitos países. Seguindo o governo neste rumo e o povo não identificando melhora na condição de vida, o discurso da extrema-direita atrai parcelas importantes, como atraiu nas eleições municipais de 2024.
Qual o papel dos sindicatos neste cenário? Naturalizar o neoliberalismo? Atender o humor do “Mercado”? ou as negociatas do centrão? Criminalizar a pobreza chamando os beneficiários de bolsa família e do BPC de “malandros” e “fraudadores”?
No caso do nosso acordo de greve, devemos garantir o cumprimento de conjunto de nossas pautas pecuniárias ou não. Caso haja calote ou quebra de acordo, devemos construir uma greve em 2025 para garantir reajuste, carreira e 30 horas. Além disso, devemos lutar pela Revogação do Arcabouço Fiscal, pela manutenção dos pisos da saúde e da educação, defesa da política de valorização do salário mínimo, do BPC e do Bolsa Família, a taxação de grandes fortunas, lucros e dividendos e pela auditoria da dívida pública.
Abaixo o Arcabouço Fiscal!
Reajuste já!
Aprimoramento da Carreira Já!
30 Horas já!
Nenhum direito a menos!
[1] https://auditoriacidada.org.br/conteudo/pec-do-pacote-de-cortes-ataca-a-educacao-e-outras-areas-para-atender-os-rentistas-da-divida-publica/
[2] https://x.com/deccache/status/1864034262829187132?t=ipVjFultUW8mmVgRMk332A&s=08
[3] https://auditoriacidada.org.br/conteudo/pacote-de-cortes-de-direitos-sociais-grave-ataque-ao-funcionalismo-publico/